Se importador pagou a dívida, não responde por descaminho?

Decisão do STJ considera que a falsidade no comércio exterior, quando objetiva a redução dos tributos incidentes sobre a importação, é mero crime-meio, sendo o crime-fim o descaminho.
 
Nesses termos, o pagamento do tributo elide a ação penal contra o importador pela falsidade.
 
Pagamento do imposto impede ação penal por falsidade na declaração de importação
 
O crime de descaminho – importar produtos permitidos sem recolhimento de tributos – e o crime de falsidade ideológica são autônomos. Os dois estão tipificados no Código Penal (CP), o primeiro no artigo 334 e o segundo no 299. Contudo, pode haver dependência entre eles, de forma que o crime-meio é absorvido pelo crime-fim quando fica demonstrada a relação de causalidade entre as condutas. 

Para a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ocorreu essa dependência no caso de um empresário denunciado apenas pelo delito de falso. A denúncia aponta o descaminho de mercadorias importadas e a falsidade ideológica ao informar valores subfaturados com o objetivo de sonegar imposto sobre essa importação. Contudo, sequer houve denúncia pelo descaminho, pois o tributo foi pago. 

Por entender que a falsidade serviu como meio de alcançar o fim criminoso pretendido, ou seja, não pagar o imposto integral, os ministros aplicaram o princípio da consunção. Segundo a doutrina, ele é aplicado “quando um crime é meio necessário ou fase normal de preparação ou execução de outro crime”. 

Imposto pago

A tese foi discutida no julgamento de recurso em habeas corpus em favor do empresário, que pediu o trancamento da ação penal pelo crime de falsidade ideológica. Ao conceder o pedido, o ministro Marco Aurélio Bellizze, relator do caso, destacou como juridicamente relevante o fato de ter havido o efetivo pagamento do tributo, no montante de aproximadamente R$ 116 mil. Essa quantia refere-se à diferença entre o tributo sobre o valor declarado e o que foi apurado pelo fisco para liberação da mercadoria na alfândega. 

Como o tributo foi recolhido antes mesmo de eventual ação penal por crime tributário, o relator afirmou que fica extinta a punibilidade do crime-fim. A Turma precisou decidir se persiste nesse caso a pretensão punitiva pelo crime-meio. Os ministros entenderam que não. 

“O fato de o crime de falso ter sido praticado com o propósito de ‘iludir o pagamento de tributos incidentes nas importações’ não autoriza a punição do recorrente, pela falsidade ideológica, de forma autônoma, seja porque não foi o acusado sequer denunciado pelo crime principal, descaminho; seja porque a conduta descrita na denúncia não comprova potencialidade lesiva em si, configura apenas meio para sonegar, em parte, o imposto sobre importação”, explicou Bellizze. 

Seguindo as considerações do relator, a Turma deu provimento ao recurso para trancar a ação penal por falta de justa causa. 

 

Falsidade acarreta pena de perdimento para indústria

STJ mantém perdimento de bens para indústria

Por unanimidade, a 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça manteve decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região que aplicou a pena de perdimento de mercadorias contra a empresa Indústria de Compensados Guararapes Ltda. Motivo: irregularidades relacionadas aos produtos encontrados na Zona Primária do Território Aduaneiro e à declaração de presença de mercadoria por meio do Sistema Integrado de Comércio Exterior (Siscomex).

De acordo com o relator, ministro Teori Albino Zavascki, o TRF-4 decidiu a causa com base no artigo 136 do Código Tributário Nacional (CTN), que diz, “salvo disposição de lei em contrário, a responsabilidade por infrações da legislação tributária independe da intenção do agente ou do responsável e da efetividade, natureza e extensão dos efeitos do ato”.

A empresa, responsável pela produção de fardos de madeira destinados à exportação, recorreu de decisão do TRF-4. A corte entendeu que houve emissão de presença de carga sem que ela estivesse efetivamente em zona portuária, em desacordo com o artigo 618 do Decreto 4.543/02, Regulamento Aduaneiro vigente à época dos fatos.

“Apesar de a pena de perdimento de bens não dispensar a demonstração do dano, no caso, ele está caracterizado pela dificuldade imposta pela conduta do importador à fiscalização aduaneira, cuja incumbência é, por norma constitucional, da Receita Federal”, afirmou o TRF-4.

No STJ, a empresa alegou que a falsidade de documento, fundamento utilizado pelo TRF-4 para aplicação da pena de perdimento de bens, representa crime na esfera penal por falsidade material ou ideológica, situação em que a responsabilidade é pessoal do agente infrator. Por isso, disse a empresa, a pena não poderia alcançá-la.

Além disso, sustentou a existência de dissídio jurisprudencial no que diz respeito à responsabilidade que acarreta a pena de perdimento dos bens, que seria subjetiva, razão pela qual não poderia ser aplicada à empresa, já que em nenhum momento ficou comprovada a participação das proprietárias da mercadoria no suposto ilícito. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.