Subfaturamento não pode ser punido com perdimento de mercadoria

Suspeita de subfaturamento não motiva perdimento

Por Jomar Martins | Conjur

O Fisco só pode reter mercadorias na alfândega se provar que houve subfaturamento “qualificado” por outros meios de fraude, como a falsidade material, e não apenas por simples suspeita. A jurisprudência, dominante no Tribunal Regional Federal da 4ª Região, levou a 1ª Turma a manter sentença que determinou a liberação de mercadorias importadas da China retidas no Porto de Itajaí (SC) por suspeita de subfaturamento.

A exemplo do juízo de primeiro grau, que acolheu Mandado de Segurança impetrado pelo importador, o colegiado não viu motivos para a Receita Federal impor retenção demasiada do desembaraço aduaneiro, exigindo documentos que não são pedidos numa operação de importação.

A relatora da Apelação no TRF-4, juíza convocada Carla Evelise Justino Hendges, disse que os argumentos que embasaram a instauração do Procedimento Especial de Controle Aduaneiro (Peca) não revelam indícios da prática de infração punida com pena de perdimento, tal como exigido pela jurisprudência. O acórdão, à unanimidade, é da sessão de julgamento do dia 8 de maio.

O caso


A Pippi Pneus Ltda entrou com Mandado de Segurança contra ato, assinado pelo inspetor da Receita Federal no Porto de Itajaí (SC), que reteve mercadorias descritas em seis Declarações de Importação, trazidas da China. As DIs foram parametrizadas pelo canal vermelho de conferência aduaneira por causa da suspeita de subfaturamento. Os desdobramentos do caso poderiam descambar para a pena de perdimento das mercadorias.

Para pôr fim à retenção, o Fisco exigiu que o importador lhe apresentasse cópia da Declaração de Exportação processada pela alfândega do país exportador, reconhecida por notário público, consularizada e traduzida por tradutor juramentado. O importador disse que a exigência era ilegal.

A autoridade foi ouvida pelo juízo e defendeu a legalidade do ato. Alegou que Procedimento Especial de Controle Aduaneiro foi instaurado em função de suspeita quanto à autenticidade da fatura comercial; do preço pago (ou a pagar) das mercadorias declaradas; e de dúvidas quanto ao real preço da operação, pela diferença significativa entre o preço declarado e os valores médios relativos a importações similares.

A sentença


O juiz Antônio Fernando Schenkel do Amaral e Silva, da 2ª Vara Federal de Itajaí, confirmou a liminar solicitada e concedeu a segurança ao importador. A decisão judicial determinou à Receita Federal obstar o prosseguimento do Peca, já que o fundamento empregado pela autoridade aduaneira não estava amparado legalmente; e mandou prosseguir normalmente os trâmites de desembaraço das mercadorias importadas, sem necessidade de prestar garantias.

Para o juiz, o subfaturamento, por si só, enseja o lançamento da diferença de tributos e aplicação de multa, e não o perdimento. E mais: a pena de perdimento só seria cabível se o subfaturamento fosse procedido mediante falsidade material.

Em caso de retenção de mercadorias, destacou o juiz, a jurisprudência afirma que é preciso uma situação concreta — que não a própria operação — que justifique a instauração do procedimento. Por essa razão, o caput do artigo 65, da Instrução Normativa 206/2002, da Secretaria da Receita Federal, fala em “fundada suspeita” — isto é, fundada em indícios palpáveis.

“Nesta esteira, imperioso reconhecer que não constou do termo de intimação fiscal a descrição de qualquer fato concreto a ensejar a submissão das mercadorias a Procedimento Especial de Controle Aduaneiro, fazendo remissão tão-somente à suspeita de fraude.” Em vista disso, entendeu que não há um fato concreto apontado para subsidiar a paralisação do despacho de importação das mercadorias.

Por fim, o titular da 2ª Vara Federal de Itajaí reconheceu que a tradução juramentada e a consularização da Declaração de Exportação não são solicitadas para as importações em geral. Assim, o Fisco só poderia exigir a complementação da documentação se apontasse fato objetivo que pudesse ensejar a presunção de falsidade material.

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Mercadoria abandonada em Porto, sem registro de DI, não se submete à legislação brasileira

O julgado abaixo decorre de ação movida pela exportadora, que alega o seguinte: a) a mercadoria continuaria sendo internacional, não se submetendo à legislação brasileira, já que não passou pelo procedimento de nacionalização; b) como não recebeu o pagamento pelo bem, a empresa estrangeira permanece como proprietária do mesmo.

Ora, caso o julgado seja favorável ao pleito da empresa estrangeira, um precedente será aberto para causas parecidas, o que poderá desencandear uma onda de ações contra leilões da Receita Federal, já que a maioria tende a destinar/leiloar mercadorias que não tiveram o seu procedimento de nacionalização iniciado no prazo legal.

Justiça suspende leilão de mercadoria importada

A Justiça Federal do Distrito Federal determinou a suspensão do leilão de uma máquina importada da Itália, mas não retirada pelo comprador na alfândega. Como o importador brasileiro não realizou o que se chama de nacionalização do bem, que ocorre a partir do registro da declaração de importação e o pagamento de impostos relativos à operação – como IPI, ICMS, PIS e Cofins – a Receita Federal declarou o perdimento da mercadoria. A consequência desse ato é o leilão do bem, avaliado em R$ 200 mil. Mas cujo valor real seria de R$ 500 mil. A União recorreu da decisão.

A empresa que exportou a máquina entrou na Justiça para pedir a suspensão do leilão e da pena de perdimento. Os advogados que a defendem, Rodrigo Rigo Pinheiro e Guilherme Braz de Oliveira, do escritório Buccioli & Advogados Associados, afirmam que a cliente não recebeu o pagamento pelo bem. Este, por sua vez, ao entrar no Brasil não chegou a ser nacionalizado e, portanto, ainda seria de propriedade da companhia italiana. Dessa forma, a exportadora não poderia ser penalizada pela Receita Federal, uma vez que a norma brasileira não se aplicaria a produto estrangeiro, mas apenas aos nacionalizados.

Outro argumento, segundo Pinheiro, seria o fato de a exportadora estrangeira não ter sido notificada pela Receita de que a máquina teria sofrido a pena de perdimento e seria levada a leilão. O advogado afirma que a companhia soube do procedimento por terceiros. “Ela não poderia ser penalizada sem ser notificada para se manifestar no processo administrativo”, afirma Pinheiro.

O juiz federal substituto da 9ª Vara do Distrito Federal, que concedeu a tutela antecipada, entendeu que foi comprovado que a importadora não deu início ao processo de desembaraço aduaneiro com o registro da declaração de importação. Por essa razão, concluiu que o bem ainda seria de propriedade da exportadora. O magistrado também entendeu que a companhia deveria ter sido notificada para manifestar se teria interesse em manter o bem.