Artigo: “Restringir importações: má ideia”

Restringir importações: má ideia

Por Pedro Ferreira e Renato Fragelli

Nos últimos anos, o Brasil vem assumindo uma postura francamente hostil ao comércio exterior, coibindo a concorrência dos produtos importados. Pouco a pouco as reformas liberalizantes dos anos 1990 vão sendo revertidas. O recente aumento das tarifas de importação de 100 produtos constitui somente mais um passo nessa direção. O Brasil é hoje um dos países que mais aplica medidas antidumping no mundo, instrumento que deveria se restringir aos produtos que recebem subsídios ilegais em seus países de origem. Não se pode esquecer que a tarifa média brasileira, cerca de 12% antes do recente aumento, é muito superior à média mundial.

Ao somar todas as taxas e tributos incidentes sobre importados, conclui-se que o Brasil está entre os países mais fechados do mundo. O resultado se reflete em baixo volume de comércio exterior.

A restrição aos produtos importados é uma péssima política de longo prazo para a economia brasileira, embora a curto prazo seja ótima para os acionistas e trabalhadores dos setores protegidos. Não há muita controvérsia entre os economistas a respeito das implicações sobre a perda de bem-estar para a sociedade das restrições ao comércio exterior: elas encarecem produtos e restringem as escolhas dos indivíduos. E em relação ao crescimento e produtividade da economia?

Há argumentos suficientes e evidência estatística abundante de que abertura comercial eleva a produtividade

O argumento de que a proteção aumentará a competitividade dos setores protegidos não faz qualquer sentido quando por “competitividade” entende-se produtividade. Ao contrário, há argumentos suficientes – e evidência estatística abundante – de que abertura comercial eleva a produtividade e a eficiência da economia. A vantagem conquistada no presente por meio de barreiras ao comércio implica perda de produtividade no médio e até no curto prazo.

Os argumentos são muitos. Como estaria a China sem insumos de produção importados? Como a produtividade do campo neste país é muito baixa e a oferta doméstica de minerais muito limitada, uma parcela muito grande da força de trabalho teria que permanecer na região rural para suprir o mercado local com estes produtos. Assim, haveria escassez de trabalhadores para a indústria que, além disto, pagaria mais caro pelas matérias-primas chinesas do que paga hoje pelas importadas. Em artigo ainda em preparação, Pedro Ferreira e Marcelo Santos calculam, por meio de simulações computacionais, que o produto por trabalhador chinês cairia a menos da metade do valor atual, caso se impusessem restrições drásticas às importações. Obviamente trata-se de um argumento por absurdo. Mas o ponto relevante é que a importação de bens em cuja produção a China revela-se pouco produtiva permite uma melhor alocação de recursos e uma especialização em setores onde sua eficiência é muito alta, aumentando a produtividade de toda a economia.

Um segundo argumento é que o protecionismo exacerbado revela-se particularmente deletério ao crescimento quando atinge a importação de bens de capital. A importação de máquinas, equipamentos e produtos intermediários – alvo de grande parte das últimas medidas protecionistas – constitui um importante veículo de absorção de tecnologia de ponta embutida nesses produtos. Diante do encarecimento dos bens de capital e bens intermediários, as firmas nacionais vêm-se compelidas a adotar tecnologias menos avançadas, o que reduz a eficiência da produção local e aumenta seu preço. O encarecimento de bens de capital e bens intermediários propaga ineficiências mais intensamente que restrições à importação de bens finais de consumo, pois afeta não apenas diretamente como também indiretamente os setores que os utilizam como insumos em alguma etapa do processo produtivo.

Finalmente, a pressão da concorrência de importados induz as firmas domésticas a promover melhorias de produtividade e gestão para sobreviverem ou manterem participação no mercado. Afinal, a adoção de tecnologias e novas técnicas de gestão envolve custos e riscos que podem ser evitados na ausência de concorrência. Ademais, a entrada de importados no mercado doméstico reduz o poder de monopólio das firmas locais e portanto seus preços. Isto não só induz a melhorias de produtividade como beneficia os consumidores.

Os produtores nacionais têm razão quando reclamam da péssima infraestrutura e de uma estrutura tributária excessivamente burocrática e distorcida, fatores que reduzem a produtividade e aumentam o custo de se produzir no país. Números da pesquisa “Ease of Doing Business” do Banco Mundial, que mede e compara ambiente de negócios no mundo todo, mostram que o tempo gasto com pagamento de impostos no Brasil é cerca de sete vezes maior que a média da América Latina e 14 vezes maior que na OECD. O total de impostos e contribuições sobre salários como proporção dos lucros é mais que o dobro que a média da América Latina.

Entretanto, e como já se enfatizou algumas vezes neste espaço, a solução para uma distorção não deve ser a imposição de uma segunda distorção. A proteção aos setores menos produtivos reduz a eficiência e competitividade do país. A maior proteção contra a competição de importados mantém inalterado o problema original e adiciona um novo. A proteção excessiva beneficia temporariamente um grupo limitado de setores e firmas, mas prejudica não só os consumidores brasileiros mas a economia como um todo no longo prazo.

Pedro Cavalcanti Ferreira e Renato Fragelli Cardoso são professores do pós graduação da Escola de Economia da Fundação Getulio Vargas (EPGE-FGV)

Resolução do Senado Federal já complica antes mesmo de vigorar

Unificação do ICMS pode reabrir disputas estaduais

Por Marta Watanabe | Valor Econômico

A unificação da alíquota interestadual do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre importados deve dar origem a novas discussões entre os Estados. Para especialistas, o texto da Resolução do Senado nº 13, que estabeleceu a alíquota de 4% nessas operações, deixa margem para concessão de novos incentivos fiscais pelos Estados ou para planejamento tributário pelas empresas.

Claudio Trinchão, coordenador dos Estados no Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), diz que pontos importantes resultantes da resolução devem ser regulamentados e começarão a ser discutidos no grupo técnico do órgão nas próximas semanas. “Essas questões são contundentes e demorarão para ser definidas, porque os Estados com certeza terão entendimentos antagônicos.”

Uma das questões que têm levantado dúvidas é se a alíquota de 4% é aplicável somente na primeira venda interestadual ou se nas subsequentes também.

Para a advogada Ticiana Carneiro da Cunha, do Machado Associados, essa é uma das questões que devem passar pelo Confaz. Ela acha que o órgão deverá definir se as vendas seguintes devem seguir a alíquota única ou as alíquotas para as demais operações: de 7% ou 12%, conforme o destino.

Caso seja aplicável a alíquota de 4% em toda as operações interestaduais da cadeia de comercialização do importado, surgem outras questões que podem causar conflitos entre os Estados, diz Ticiana. A advogada lembra que, segundo a resolução, a alíquota unificada é aplicável a mercadorias com conteúdo de importação superior a 40%. E esse conteúdo é calculado com base na fatia que o valor da parte importada representa do valor total de revenda do produto.

O problema, explica Ticiana, é como as empresas da cadeia de comercialização que façam as vendas interestaduais vão ter acesso ao valor de importação. “E essa informação é importante para calcular o ‘conteúdo de importação’ e também para aplicar a alíquota correta da operação interestadual.” Sem isso, a empresa fica sem segurança para fazer o recolhimento do imposto interestadual e, caso decida pela alíquota de 4%, pode ser questionada pela Fazenda do Estado de origem. “Se a escolha for pela alíquota de 12% a empresa pode ser questionada pelo Estado de destino, que não aceitará o crédito nesse percentual.”

Alessandra Craveiro, sócia do Guerra Doin & Craveiro, acredita que a alíquota de 4% seja aplicável somente na primeira operação interestadual. Nesse caso, porém, surge uma brecha para novo incentivo fiscal que, na prática, permitirá ao produto importado continuar a ter carga tributária menor do que o fabricado nacionalmente. Isso aconteceria por meio de um benefício de ICMS concedido não mais pelo Estado da importação, mas sim pelo Estado de revenda da mercadoria.

Por exemplo, uma mercadoria importada pelo Estado de Santa Catarina e que tenha a primeira operação interestadual de venda ao Estado de Goiás. Essa operação é tributada a 4%, mas a Fazenda de Goiás pode conceder um crédito presumido para ser abatido da operação interestadual seguinte: uma venda para São Paulo, por exemplo. Essa venda seria tributada a 12%, gerando crédito nessa alíquota em São Paulo, mesmo que no Estado de origem, Goiás, não tenha sido pago o imposto nesse percentual.

“Isso é algo que pode acontecer porque na verdade a guerra fiscal entre os Estados ainda existe. O que se tentou combater com a nova resolução foi somente a guerra fiscal dos portos”, resume o tributarista Fernando Ayres, do Mattos Filho Advogados. Alessandra acredita que há muitas questões nebulosas, o que pode resultar em questionamentos judiciais sobre a constitucionalidade da resolução ou tornar inaplicável a unificação de alíquotas.

“A resolução delega ao Confaz a definição de critérios e procedimentos em um processo de certificação de conteúdo de importação”, diz Alessandra. As empresas, conta, não têm ideia nenhuma de como essa certificação será feita. “Isso existe em alguns setores, como a indústria do petróleo, por exemplo, mas é um processo extremamente complexo, cheio de procedimentos. O conteúdo de importação é dado por empresas certificadoras especializadas. Será que isso será viável em outros tipos de mercadorias e bens?”

Outra questão polêmica, levanta Alessandra, fica por conta da definição de existência de similar nacional pela Câmara de Comércio Exterior (Camex). Esse órgão já participa do exame de fabricação nacional de bens de capital. Essa verificação é feita quando o importador da máquina quer um benefício tributário de redução do imposto de importação. Nos últimos meses, importadores de bens de capital já apontam atrasos no exame desse benefício, o que aumenta o receio de que o órgão pode não dar conta da verificação de existência de similaridade nacional para as diversas mercadorias desembarcadas. “A importação é muito dinâmica e não se sabe se os órgãos vão conseguir acompanhar isso.”

Trinchão, coordenador do Confaz, diz não ter nenhuma resposta às primeiras dúvidas sobre a resolução, que entra em vigor em 2013. “A redação da resolução não foi muito feliz. O Confaz não participou da aprovação da medida, mas recebeu atribuições”, diz ele, também secretário de Fazenda do Maranhão. “Isso levará muito tempo de análise do grupo técnico do Confaz e muita discussão até a chegada de um consenso. Há várias situações práticas e nem sabemos como o Confaz vai formalizar essa regulamentação: se por meio de ajuste ou protocolo, por exemplo.”

Artigo: “Comércio Exterior tem início de ano agitado”

Comércio Exterior tem início de ano agitado

Por Adriana Dantas

O ano de 2012 começou agitado, com a criação de novas regras e procedimentos que afetam o acesso de importações ao mercado brasileiro. No final de janeiro, a Câmara de Comércio Exterior (Camex) publicou nova resolução que institui o Grupo Técnico sobre Alterações Temporárias da Tarifa Externa Comum do Mercosul (GTAT- TEC). Tal grupo tem como missão analisar pleitos voltados à proteção de setores da indústria doméstica, por meio da elevação temporária do imposto de importação (II) de 100 produtos, com prazo para apresentação de pedidos vigente até o dia 02 de abril próximo.

Em um contexto de maior atratividade do mercado nacional a produtos importados, a possibilidade de proteção, em casos em que desequilíbrios comerciais fiquem caracterizados, é bem recebida por setores da indústria mais afetados pela pressão de importações, sobretudo de produtos provenientes da China e do sudeste asiático.

Segmentos da economia dependentes de importações, por outro lado, ficam preocupados ante a perspectiva de terem seu negócio afetado pelo aumento de impostos de importação, com impactos econômicos muitas vezes significativos, fruto de um procedimento confidencial, não sujeito ao contraditório.

A reunião da Camex de fevereiro resultou na criação do Grupo Técnico de Avaliação de Interesse Público (GTIP), grupo que tende a alterar a dinâmica dos processos de defesa comercial.

O GTIP exercerá função distinta à do GTAT-TEC, função essa circunscrita à análise dos impactos da aplicação de direitos antidumping e compensatórios (anti-subsídios) sobre setores da indústria afetados por eventual aplicação de tais direitos.

Investigações antidumping e anti-subsídios são conduzidas pelo Departamento de Defesa Comercial (Decom) da Secretaria de Comércio Exterior (Secex) que elabora parecer determinando a aplicação ou não de direitos antidumping e compensatórios, após análise de dados apresentados no decorrer de um intenso processo investigatório.

O parecer do Decom é estritamente técnico e não considera os impactos econômicos mais amplos que a futura restrição às importações acarretará sobre o setor envolvido. Por exemplo, falta de capacidade produtiva, eventuais aumentos sobre os preços de insumos e aspectos concorrenciais não são considerados na análise. Avaliação mais ampla acerca dos referidos impactos econômicos ficava sob a responsabilidade de outro grupo, o Grupo Técnico de Defesa Comercial (GTDC), que, na prática, apenas ratificava o parecer do Decom nos casos de recomendação pela aplicação de direitos antidumping e compensatórios.

Já o recém-criado GTIP, grupo integrado por representantes dos sete ministérios que compõem a Camex, institucionaliza o procedimento de análise da suspensão ou alteração de medidas antidumping e compensatórias provisórias e definitivas por razões de interesse público.

A institucionalização da cláusula do “interesse público” nos processos de defesa comercial aproxima o sistema brasileiro do europeu. Este inclui a cláusula do “interesse comunitário”, que pode impedir a imposição de medidas antidumping e compensatórias mesmo ante a determinação positiva da prática desleal de comércio, do dano à indústria considerada e do nexo causal entre os dois elementos.

No caso europeu, a análise do interesse comunitário integra todas as decisões e, junto com a determinação positiva de dumping, dano e nexo causal, é um requisito para a aplicação do direito antidumping. Na prática, são poucos os casos onde a Comissão Européia concluiu não ser do interesse da União Européia a aplicação de medidas de defesa comercial. Exemplos de casos onde a cláusula foi aplicada são investigações anti-dumping envolvendo importações de salmão do Chile e álbuns fotográficos.

Ainda, no caso europeu, o pouco recurso à cláusula do interesse comunitário deve-se, sobretudo, à falta de organização dos setores afetados pelas medidas, ou seja, dos importadores e usuários do produto em questão. No caso brasileiro, a organização desses setores e sua conduta pró-ativa também será fundamental.

Com a publicação da Resolução 13 da Camex, de 1o de março de 2012, pedidos de suspensão ou alteração de medidas antidumping e compensatórias deverão ser apresentados à Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae) do Ministério da Fazenda, que coordenará a apreciação dos elementos de fato e de direito que amparam o pedido.

Trata-se de inovação importante que permitirá a maior participação do Ministério da Fazenda nesse processo por meio da Seae, que, até então, exercia participação tímida em processos de defesa comercial.

Um ponto de destaque é a possibilidade de qualquer membro do GTIP, ou outro órgão da Administração Pública Federal, solicitar, “a qualquer tempo”, informações necessárias à análise. Essa previsão legal tem potencial para gerar confusão tanto para as partes envolvidas, como para a administração pública.

Em todo caso, a criação do GTIP e a institucionalização da cláusula do interesse público são sinais positivos para importadores e setores da indústria dependentes das importações, os quais serão mais ouvidos sob o novo mecanismo. A SEAE deverá também trazer elementos da sua experiência em questões concorrenciais para a defesa comercial.

Em resumo, enquanto a criação do GTAT-TEC gerou preocupações para os setores dependentes do fluxo continuo de importações, o recém-criado GTIP sinaliza que suas preocupações serão mais ouvidas muito embora em contexto distinto, o dos processos antidumping e compensatórios.

Estudo da CNI: 1/5 dos produtos consumidos no Brasil são importados

 

19,8% dos produtos industriais consumidos no País são importados

Levantamento mostrou ainda que a participação de insumos importados utilizados pela indústria brasileira alcançou 21,7% em 2011

19 de março de 2012
Eduardo Cucolo

BRASÍLIA – Praticamente um em cada cinco produtos industriais vendidos no Brasil em 2011 foi fabricado em outro país, segundo levantamento da Confederação Nacional da Indústria (CNI) divulgado nesta segunda-feira, 19. O porcentual de produtos importados alcançou o nível recorde de 19,8% no ano passado, ante 17,8% em 2010.

O levantamento mostrou ainda que a participação de insumos importados utilizados pela indústria brasileira alcançou 21,7% em 2011. Em 2010, o porcentual foi de 19,1%.

A CNI informou ainda que a participação das exportações na produção da indústria cresceu de 17,8% em 2010 para 19,8% em 2011. Apesar do crescimento, o valor está abaixo do recorde de 22,9% alcançado em 2004.

IPI não incide na saída de produtos importados

IPI não incide sobre venda de produto importado

A 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região confirmou que o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) não incide sobre operações de comercialização de produtos importados de uma empresa catarinense. A decisão é do dia 31 de janeiro. Cabe recurso.

A Alpha Trade Importação de Eletrônicos ajuizou ação na Justiça Federal pedindo a inexigibilidade do tributo. Sustentou que os produtos importados já vêm montados e embalados para serem comercializados aos varejistas e consumidores finais no território nacional e, por isso, pagar o IPI com a saída do produto do estabelecimento seria bitributação.

Após a decisão favorável à empresa em primeiro grau, a União recorreu, argumentando que é desnecessária a industrialização do produto para a incidência do fato gerador do IPI.

Na análise do recurso, o relator do processo, juiz federal Luiz Carlos Cervi, convocado para atuar no tribunal, entendeu que a tese de bitributação levantada pela empresa procede. Para ele, deve ser reconhecido pela União que o processo de industrialização ocorre antes da importação e que, durante o despacho aduaneiro, já houve a devida tributação.

Desta forma, a Alpha não deve pagar o IPI quando ocorrer a venda do produto, decidiu o magistrado.Com informações da Assessoria de Imprensa do TRF-4.