Nova alta do IPI tem objetivo de proteger indústria nacional

Alta do IPI para motos e micro-ondas exclui 90% da produção nacional

Por Thiago Resende | Valor

O subsecretário de Tributação da Receita Federal, Sandro de Vargas Serpa, informou nesta quinta-feira que 90% da produção nacional de aparelhos de ar-condicionado, de motocicletas e de micro-ondas não serão atingidas pela elevação a 35% da alíquota de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) sobre estes itens. Isso porque a sobretaxa não inclui os produtos fabricados na Zona Franca de Manaus, onde há isenção de IPI.

Segundo a Receita, apenas 10% da produção nacional dos modelos de ar-condicionado, motocicletas e micro-ondas afetados pela medida estão fora da região de tributação especial. Para os produtos importados e fabricados fora da Zona Franca de Manaus haverá elevação de IPI para 35%. A medida começa a valer em 1º de setembro deste ano e não há prazo para deixar de vigorar.

No caso de ar-condicionado de baixa potência (até 7,5 mil frigorias/hora), a alíquota do IPI foi mantida em 20%. Atualmente, o IPI cobrado em fornos de micro-ondas é de 30%.

A medida publicada no “Diário Oficial da União” (DOU) desta quinta-feira afeta motocicletas de diferentes cilindradas. Para motores com até 50 cilindradas, a alíquota do imposto passará de 15% para 35% em setembro. Acima disso, o IPI aumentará de 25% para 35%.

“O decreto foi editado com a intenção de dar auxílio a alguns produtos em que a produção sofre com a concorrência externa”, afirmou Serpa.

O aumento de IPI para esses três produtos pode render aos cofres públicos R$ 121,89 milhões por ano, segundo a Receita. Para que a alíquota retorne ao patamar atual, ainda sem elevação, será necessário outro decreto, explicou o Fisco.

Proteção foi lobby da indústria automobilística

Lobistas de fábricas monitoraram medidas

Por Marli Olmos | De São Paulo

Todo o processo de elaboração das medidas para elevar a tributação dos carros importados, anunciada pelo governo na semana passada, foi cuidadosamente acompanhado pelos lobistas de quatro fabricantes: Fiat, Ford, General Motors e Volkswagen. Nenhuma dessas empresas precisa fazer qualquer alteração na sua atividade, porque o novo modelo, criado por meio de decreto, se ajusta perfeitamente à estrutura que as quatro já têm na América Latina. O efeito protetor da decisão governamental garante a montadoras, que hoje dominam 54% do mercado brasileiro, fôlego e tempo adicional de preparo para enfrentar a inevitável chegada de novos concorrentes.

A repentina mudança de regras expõe que, na falta de políticas industriais de longo prazo para setores fortes, como a indústria automotiva, o poder público se agarra a medidas paliativas. O governo de Dilma Rousseff recorreu a uma fórmula muito usada pelos antecessores: mudou a regra do jogo em meio à pressão, que se intensificou com notícias de que os estoques de carros novos haviam aumentado e os operários começavam a tirar longos períodos de folga.

Nos últimos meses, representantes de Fiat, Ford, GM e Volks se alinharam em torno da mesma causa e negociaram com o governo de forma harmônica. Há duas semanas, segundo contam fontes familiarizadas com o assunto, a direção da Anfavea, entidade que representa essa indústria, pediu a presença, na mesa de negociações, dos executivos com mais experiência nas relações com o governo nessas quatro empresas.

Com a iminência do anúncio das novas medidas, integrantes da equipe de lobistas chegaram a cancelar compromissos no exterior. Era a consagração de meses de trabalho para convencer o governo a encontrar uma fórmula para premiar o império industrial que essas empresas ergueram no Mercosul nas últimas quatro décadas.

Nenhum detalhe da estrutura já montada na América Latina escapou na elaboração do decreto. A nova regulamentação elevou em 30 pontos percentuais o IPI dos carros com menos de 65% de peças nacionais, mas abriu exceção para os carros e peças que vêm do Mercosul e México. Volkswagen, General Motors, Ford e Fiat têm fábricas na Argentina e México. Como o Brasil tem acordos de intercâmbio comercial com Mercosul e México, os veículos produzidos nessas regiões já estavam livres do Imposto de Importação de 35%.

O interesse das quatro maiores acabou ajudando as empresas do setor com menos história de relacionamento com o governo. As francesas Renault, Peugeot e Citroën fabricam no Brasil e na Argentina. Trata-se de uma estrutura criada na expectativa que o Mercosul funcionasse como bloco. A ideia de dividir a produção se baseou numa estratégia de complementaridade de linhas.

A japonesa Nissan, que compartilha a fábrica brasileira com a Renault, será uma das mais beneficiadas pela isenção de imposto dos carros vindos do México. A fábrica mexicana da Nissan abastece o mercado do Brasil, incluindo o primeiro compacto da marca, o March, prestes a ser lançado aqui.

Em relação à nacionalização, vale lembrar que há anos a maior parte dos carros fabricados no Brasil leva alta quantidade de peças produzidas no país, o que é conveniente num setor que trabalha no chamado “just in time” – modelo de manufatura sem estoques.

As montadoras com fábricas no Brasil não serão afetadas sequer na importação de veículos fora do Mercosul e México, porque o cálculo do conteúdo regional levará em conta receita bruta total da empresa e não custo por veículo. As quatro veteranas trazem automóveis da América do Norte e Europa para poder atuar no mercado de alto luxo.

A necessidade de dedicar parte substancial da receita em pesquisa e desenvolvimento, outro requisito fixado pelo decreto, também não dará nenhum trabalho às empresas com mais tempo de Brasil. O setor nunca encontrou dificuldades para dedicar-se à arte da criação de automóveis num país com farta matéria-prima, extensão territorial suficiente para produzir em escala e mão de obra preparada.